Aquele dia

  Já era tarde da noite quando Jaqueline voltava de mais um dia de aulas
na faculdade. Todos os dias ela pegava às sete da noite e largava às
onze e quarenta. O trajeto até sua casa dava para fazer  a pé mesmo,
levando de uns cinco a dez minutos andando. Porém, existia um atalho que
encurtava mais o caminho, e o que são cinco a dez minutos andando passa
a ser dois, no máximo três minutos. Porém, esse atalho era cortando uma
estrada de terra, cercada por árvores e um mato muito denso. De dia, era
bem confortável passar por ali e ouvir o canto dos pássaros e apreciar o
verde das matas. Mas, durante à noite, aquele local passava a ser tocaia
de bandidos ou até mesmo, animais grandes que poderiam rondar a mata
pelas altas horas da noite.
  Jaqueline temia aquele lugar. Vivia dizendo que nem morta ela tomaria
aquele atalho. Preferia andar os cinco minutos do que cortar caminho por
um lugar tão perigoso e sombrio.
  Numa certa vez, Jaqueline estava super indisposta para ir à faculdade.
O tempo tinha amanhecido nublado e ficou feio durante todo o dia. A
noite chegou rapidamente, e ela cada vez mais desanimada. O dia não estava
legal, mas não era só isso. Ele estava mais estranho do que
o normal. Parecia que alguma coisa estava tentando, implorando para que
Jaqueline ficasse em casa naquele dia. O porém é que ela tinha um
trabalho muito importante na faculdade e não poderia faltar de jeito
nenhum, caso ela faltasse, não ganharia os pontos extras propostos
naquele trabalho.
  Seis e vinte da noite e Jaqueline começou, então, a se arrumar.
Colocou um casaco na bolsa já que estava meio frio e ela acreditava que
estaria muito mais frio quando ela voltasse e colocou também um
guarda-chuvas, pois, a noite estava mais escura do que o comum.
  Quinze para às sete, ela saiu de casa. Aparentemente, tudo estava
normal. às nove da noite tinha um intervalinho de dez minutos e depois,
as aulas continuavam até bater as onze e quarenta, , hora da
saída.
  Foi nesse intervalo que Jaqueline e os demais ali da faculdade
notaram uma ventania junto com trovões que começaram fracos e depois, se
intensificaram com o passar do tempo.
  Durante as aulas do segundo tempo, os alunos notaram um forte som de
chuva lá fora. O toró veio acompanhado de trovões que ribombavam no
céu. Jaqueline começou a pensar no mal que ela tinha feito. Deveria ter
ouvido sua intuição e nunca ter saído de casa. Mas o que ela poderia
fazer? Se fosse um dia comum, ela até poderia faltar, mas tendo trabalho
ficava difícil.
  Quando as aulas acabaram e todos foram liberados, a chuva tinha dado
uma trégua, porém, trovões ainda tremiam até o chão. Jaqueline se
despediu de alguns amigos e tomou seu caminho de volta para casa, doida
para chegar logo e cair na cama, pois aquele dia na faculdade havia sido
exaustivo.
  Estava tudo bem até o momento em que ela notou, em uma rua que levava
direto para a rua de sua casa que um poste estava tombado. A rua estava
em completa escuridão, e fios estavam caídos na estrada. A tempestade
tinha sido tão grande que derrubou uma árvore que caiu arrastando a
fiação e fazendo o poste ficar tombado. não tinha como passar. O perigo
de alguém ser eletrocutado ali era grande e, só de pensar nisso,
Jaqueline sentiu um calafrio percorrer seu corpo. Só havia lhe restado
aquele caminho, aquele atalho que não era aconselhável passar por ele.
Mas, o que ela ia fazer? Iria ficar parada no meio do nada esperando o
dia amanhecer para só então ela poder tomar o atalho? Como iria passar a
madrugada inteira ali? Não existia outro caminho, ou ela pegava o
atalho, ou passava a madrugada inteira ali, parada no meio do nada
olhando para uma rua escura e devastada pela tempestade.
  Sendo assim, Jaqueline não teve escolha. fez a volta e foi andando em
direção ao atalho, pedindo muito a deus para que a guardasse, pois ela
precisava passar ali. Justo ela, que tinha dito a si mesma que nunca
passaria naquele lugar. Agora, as circunstâncias provavam totalmente ao
contrário. Nessa hora, ela se lembrou da sensação ruim que sentiu antes
de sair de casa. Lembrou do sentimento de angústia, lembrou do dia ter
amanhecido estranho e da indisposição que ela estava para ir à
faculdade.
  Antes de pegar o caminho, Jaqueline olhou para os lados para ver se
ela via alguém, algum homem ou até mesmo algum vizinho passar por ali
para que este, então, pudesse acompanhá-la naquele caminho tão macabro
até em casa. Esperou, esperou, esperou e... Nada. Não teve jeito. Ou ela pegava o
atalho logo ou se molharia na chuva que ainda estava por vir. Chuviscos
já começavam a cair novamente, e Jaqueline já começou a sentir, mais do
que nunca, vontade de chegar em casa.
  Ela se virou para o caminho e, na hora em que ela ia dar o primeiro
passo, um relâmpago clareou o céu e um trovão ribombou alto,
estremecendo o corpo da bela jovem. Nesse momento, ela gelou. No momento
em que o relâmpago clareou todo ambiente, ela viu, parado ao longe o que
parecia ser a silhueta de um homem. um homem de costas, aparentando ter
uns dois metros de altura. Não dava para ver muito bem, mas parecia sim,
ser a silhueta de um homem de costas, um homem bem alto. Mais recuperada
do susto, Jaqueline olhou bem o caminho escuro. Apesar do poste tombado
na outra rua, havia luz em outras partes, inclusive ali, onde ela tava.
A queda da árvore afetou apenas aquela rua onde ela deveria passar para
ir para casa, mas o resto estava tudo iluminado. Então, com a luz
proveniente de outros postes ali na região, ela olhou mais uma vez para
o caminho que ela ia percorrer, então ela viu. Onde a luz pouco chegava
naquele caminho estranho, ela viu, parado ao longe, uma silhueta alta,
aparentando ter uns dois metros de altura. Daí ela pensou: "Na rua
normal por onde eu passo, fios estão estirados no chão, no atalho tem um
homem ou sei lá o que no meio do caminho, e agora?
  De repente, ela se lembra de um fato que fez sua espinha congelar
ainda mais. Recentemente, uma reportagem na TV falava sobre um cereal
killer que estava assassinando moças jovens e largando ali, naquelas
redondezas. Ninguém tinha o paradeiro desse homem, ninguém sabia quem
era, a única coisa que a polícia tinha era o corpo das vítimas
completamente nus, com sinais de espancamento e violência sexual, e na
maioria das vezes a morte era causada por asfixia.
  O fato havia lhe causado ainda mais arrepios. Um cereal Killer em sua
redondeza? E se este cereal for aquele parado ali, no meio do nada?
  Num ato de coragem, pela vontade que ela estava de chegar em casa, ela
avançou atalho a dentro. Por alguns instantes ela olhou para o chão e
pediu a deus em pensamento para que ele a guardasse do mal que estaria
por vir. Quando ela levantou a cabeça, notou que a figura sombria não
estava mais parada no meio do nada, então ela suspirou de alívio e
apertou o passo. Ela estava no meio do caminho, onde aquelas luzes não
eram mais capazes de chegar quando um novo clarão surge, e qual não foi a
surpresa quando esse clarão veio e Jaqueline pôde ver, a poucos
centímetros de seus olhos, o tal homem sentado no chão, com a cabeça
encostada nos joelhos com algo tapando metade de seu rosto. Parecia um
capuz ou algo do tipo. Jaqueline não pensou duas vezes e esquentou a
canela, danou a correr feito uma desesperada, correu o mais rápido que
ela conseguia enquanto que atrás dela, ela ouvia passos firmes correndo
também, quase que alcançando-a. Aquele som era como o som de botas, que
pisavam firme no chão. Chegou até a ouvir suspiros ofegantes, tamanho
era o cansaço do que quer que seja que estivesse correndo atrás dela.
O atalho que tornava o caminho mais curto agora parecia até uma pista
de maratona. Parecia que ela nunca iria chegar em casa.
  Por fim, ela virou na rua de sua casa que estava deserta. Já era um
pouco mais de meia-noite, e a essa hora, sua rua não era nada
movimentada, até os ventos evitavam passar por ali quando a calada da
noite se iniciava.
  Durante a correria, faltando pouco para ela chegar no portão de sua
casa, Jaqueline olhou para trás, e viu o homem ainda correndo atrás dela.
Ela passou a mão no bolsinho da bolsa onde ela guardava a chave,
deixando-a muito mais fácil e correu, correu a todo vapor e chegou até o
portão de sua casa. Jaqueline morava sozinha, mas ela fingiu estar
chamando alguém. Esmurrou o portão e disse:
- Maurício, abre essa porta, abre, tem um louco correndo atrás de mim,
abre aqui, anda, abre!
Nesse momento, ela notou que o homem parou de correr atrás dela, mas ele
estava numa distância de uns cinco metros, parado, olhando a moça para
ter certeza se realmente alguém iria abrir o portão. Um pouco mais
aliviada, Jaqueline pega a chave, mas seu nervosismo era tão grande que
ela não conseguia achar o buraco da fechadura:
- Maurício!
Ela continuava a gritar e a bater, torcendo para que algum vizinho
escutasse aquilo e estranhasse imediatamente. Com isso, ele abriria a
porta e o home ficaria com medo e iria embora:
- Abre aqui, Maurício! Abre, e trás a arma, tem um louco querendo me
pegar!
Ela olha de relance e ver o homem ainda parado, sem ter dado um passo à
frente e nem atrás. Ele estava ali, observando-a. Nessa hora, ela tentou
mais uma vez, abrir o portão, mas o seu desespero era tanto que ela
deixou a chave cair. O homem ouviu isso, e danou a correr em sua
direção. Jaqueline pegou a chave rapidamente e, no ápice do desespero,
enfiou a chave e conseguiu, por fim, achar o buraco da fechadura.
Empurrou o portão e, na hora em que ela colocou o pé para dentro, sentiu
uma mão pesada em seu ombro, mas com muita agilidade, ela se virou e viu a mão
tentando de todas as formas puxá-la, mas ela bateu a porta na cara do
homem e se sentiu aliviada. Com isso, ela resolveu olhar pelo buraco na
fechadura, e o que ela viu a deixou apavorada. Era um homem alto,
vestindo um sobretudo preto com um capuz na cabeça. O homem estava ali
ainda, parado, em frente ao portão, talvez pensando em uma maneira de
invadir a casa. Porém, parecia que ele sabia que ela estava ali,
espiando pelo buraco. Pois ele se agaixou, e pareceu tentar olhar. Nesse
momento, Jaqueline gelou. Gelou ao ver, no momento em que ele agaixava,
que ele segurava uma faca por dentro do sobretudo. Ele ficou ali, por
cerca de um minuto agaixado olhando para ver se via alguma coisa, mas
ele pareceu não ver nada. Então, vagarosamente ele se levantou e foi se
afastando da casa e sumindo na penumbra.
  Jaqueline entrou em casa, trancou todas as portas, tomou um banho, mas
quem disse que a moça conseguia pregar os olhos?
  A partir daquele dia, Jaqueline nunca mais saiu da faculdade sozinha.
Ela sempre pedia para algum amigo que tinha carro, levá-la em casa
primeiro e só saísse depois que ela entrasse em casa. E, logo no ano
seguinte, ela pediu transferência de turno na faculdade e passou a
estudar de manhã, mas ainda assim, ela não conseguia parar de pensar naquele dia. O dia em que sua vida chegaria
ao fim...

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